Tecnologia naval auxilia estudos sobre
comportamento de animais marinhos
Elton
Alisson em 24/04/2012
Agência FAPESP – Uma tecnologia utilizada
na indústria naval – para exploração de petróleo em águas profundas, entre
outras aplicações –irá auxiliar pesquisadores da Universidade Estadual Paulista
(Unesp), no campus experimental de São Vicente, a conhecer melhor o comportamento
de raias marinhas e de água doce.
Os cientistas estão
testando em cativeiro e em breve começarão a utilizar Veículos Subaquáticos Operados por Controle Remoto (ROVs, na sigla em inglês), combinados
com equipamentos de radiotelemetria e telemetria acústica, para estudar padrões
de movimentação e distribuição de raias em rios do oeste paulista e no litoral
norte do estado.
Resultado de um projeto apoiado pela FAPESP, o estudo utilizando ROVs e
radiotelemetria especificamente para essa finalidade era inédito no Brasil.
“As tecnologias se
complementam e possibilitarão trazer à tona informações sobre a ecologia
espacial de algumas espécies de raias que ainda são desconhecidas, já que
estudos dessa natureza ainda não foram realizados no estado de São Paulo,
especialmente em função do custo elevado e da necessidade de formação
específica”, disse Domingos Garrone Neto, pesquisador da Unesp, à Agência FAPESP.O pesquisador iniciou um estudo sobre o comportamento de raias utilizando radiotelemetria – em que são inseridos no animal transmissores que emitem sinais de rádio – em 2011, no rio Paraná, na divisa com Mato Grosso do Sul.
Como o peixe cartilaginoso,
a exemplo dos tubarões, usa o sistema
eletrossensorial para detectar suas presas, Garrone começou a questionar os
possíveis efeitos dessas marcas eletrônicas no comportamento dos animais.
Para analisar os eventuais
impactos dos equipamentos de radiotelemetria em raias, o pesquisador optou por
continuar a pesquisa em cativeiro, em aquários montados especialmente para essa
finalidade.“Estamos terminando os experimentos e, em breve, saberemos se os radiotransmissores interferem ou não no comportamento das raias”, disse Garrone.
No litoral paulista, o
pesquisador conheceu o Núcleo de
Tecnologia Marinha e Ambiental
(Nutecmar), que opera ROVs, e viu a possibilidade de incorporar mais essa
tecnologia a sua pesquisa sobre ecologia espacial de raias.
Após realizar cursos na
empresa para operar o equipamento, cujos comandos são similares aos de um
helicóptero, Garrone pretende utilizá-lo em seu projeto de pós-doutorado, sob a
supervisão do professor Otto Bismark Fazzano Gadig.“Pretendemos utilizar ROVs para explorar tanto o mar como a água doce para analisar o comportamento de tubarões e raias em grandes profundidades de dia e à noite”, explicou Garrone.
Inicialmente, os pesquisadores estão utilizando um ROV cedido pela empresa parceira do projeto para realizar os estudos. Mas, no fim de abril, deverão começar a operar um equipamento próprio, importado da Rússia e adquirido com auxílio da FAPESP.
Avaliado em cerca de US$ 60 mil, o ROV que será adquirido pelos pesquisadores pode atingir até 150 metros de profundidade e é capaz de operar ininterruptamente quando plugado por um cabo de energia a uma corrente alternada, ou entre quatro a doze horas, utilizando a bateria de navios ou botes.
O equipamento, que pesa cerca de 12 quilos e tem o tamanho um pouco maior do que de um aparelho de microondas doméstico, é dotado de duas câmeras, localizadas em sua dianteira e traseira. Operadas na superfície, as câmeras captam imagens em tempo real, que são transmitidas para um monitor conectado a um HD de computador fora do ambiente aquático.
O robô também tem diodos de
laser que possibilitam avaliar a escala de tamanho dos animais com os
quais se defronta na água, além de braços articuláveis que permitem coletar
materiais no fundo do mar.
Outros acessórios do
equipamento são sonares que conseguem identificar os alvos com precisão, mesmo
quando o equipamento é operado em águas turvas, além de propulsores que
permitem que o mini-submarino navegue até 4 nós de velocidade, e emissores de
luz de LED para trabalhos noturnos ou exploração de locais com baixa ou nenhuma
luminosidade, como cavidades e ambientes profundos.
Mas, segundo Garrone, uma
das maiores inovações do ROV “brasileiro” será um sistema de depuração de
imagens que permitirá melhorar a visibilidade de imagens capturadas em águas
turvas, tornando-as extremamente limpas como as de uma piscina.
“O robô permitirá
substituir nossa presença na água por tempo ilimitado, possibilitando explorar
os ambientes com maior segurança e precisão, principalmente no mar, onde a
profundidade e a temperatura da água costumam limitar os trabalhos por longos
períodos”, destacou.
Acidentes com raias
Garrone se interessou por
estudar o comportamento de raias durante a realização de seu mestrado, em que
desenvolveu um estudo com pescadores na Amazônia e identificou que os acidentes
com raias de água doce representavam um sério problema de saúde pública na
região.
Porém, não se sabia muito
bem o comportamento desses animais aquáticos na natureza e aspectos como sua
alimentação, reprodução e interação com outras espécies. E a maioria das poucas
pesquisas disponíveis sobre essa espécie de peixe cartilaginoso era baseada em
observações indiretas do animal coletado muitas vezes por anzol, rede de
arrasto e pesca de espinhel.
Por meio de observações
subaquáticas, Garrone fez as primeiras observações subaquáticas sobre as
práticas de caça, os rituais de corte e acasalamento e o deslocamento desses
animais na natureza.
Agora, o objetivo de sua
pesquisa utilizando ROVs e
equipamentos de telemetria é aumentar e melhorar o entendimento sobre o
comportamento de raias marinhas e de água doce e tentar responder algumas
questões como se no inverno os animais que habitam a costa de Ubatuba, no
litoral paulista, procuram águas mais quentes e depois retornam no verão, quando
á água está mais aquecida, e se as correntes marinhas influenciam a
distribuição espacial desses animais.
“Essas tecnologias vão nos
dar condições de responder essas questões com muita segurança e precisão”,
disse Garrone
Os pesquisadores também
pretendem utilizar equipamentos de telemetria
acústica, em que são utilizadas ondas de som em vez de rádio, para estudar
o comportamento de raias inicialmente no mar e, futuramente, em água doce.Os trabalhos integram uma rede de pesquisas coordenadas pelo professor Otto Bismark Fazzano Gadig sobre elasmobrânquios brasileiros, como tubarões e raias, no Laboratório de Estudo de Elasmobrânquios da Unesp de São Vicente.
Elasmobrânquio = Classe (Elasmobranchii) que compreende peixes cartilaginosos com maxilares bem-desenvolvidos, fendas branquiais nos lados e boca situada ventralmente.