sexta-feira, 6 de setembro de 2013

Bióloga e cineasta rastreiam mudanças na vida marinha para documentário

Inspirados por esculturas, C. Drew Harvell e o cineasta David O. Brown rastreiam as mudanças na vida marinha.
 
C. DREW HARVELL
PARA O "NEW YORK TIMES"
Depois de nadar por algum tempo no mar frio e escuro, avistamos sobre o recife com nossas lanternas de mergulho o Octopus ornatus, o "polvo enfeitado", uma criatura de 30 cm de comprimento em um tom de amarelo âmbar com manchas brancas vistosas e riscos em seus braços.
Ele ficou sentado imperturbável à luz da câmera, nove metros abaixo da superfície, sem se abalar. Eu apontei um dedo e ele me tocou com seus tentáculos. Quando ele se moveu na outra direção, eu o segurei com as mãos em concha enquanto ele me observava com atenção.

 
Como que levitando, ele decolou suavemente e tentou deslizar sobre minha mão. Olhei em seus olhos. Então um tentáculo bateu na minha máscara. O polvo se arrastou pelo meu braço e desapareceu na noite.
Sou bióloga marinha desde o início de minha vida profissional e passei mais de 25 anos pesquisando a saúde dos corais e a sustentabilidade dos recifes. Sou fascinada pela magia dos invertebrados sésseis como corais, esponjas e pepinos-do-mar -criaturas vitais para o ecossistema, mas muitas vezes desprezadas em favor de animais mais visíveis, como tubarões e baleias.
O cineasta David O. Brown e eu queríamos mudar isso. Para fazer um documentário, "Fragile Legacy" [Legado frágil], estamos em uma missão para atrair esses invertebrados fugazes e delicados para a câmera.
Nossa inspiração vem de uma coleção de 570 esculturas em vidro maravilhosas e anatomicamente perfeitas de criaturas marinhas do século 19.
Essas delicadas dobras e filamentos de vidro formam a coleção Blaschka de invertebrados de vidro na Universidade Cornell em Ithaca, Nova York, da qual sou a curadora. Ela contém esculturas de águas-vivas encantadoras e extremamente raras do alto-mar, assim como polvos, lulas, anêmonas e lesmas-do-mar, mais comuns, porém igualmente belos, das piscinas de maré britânicas e praias mediterrâneas.
A coleção é obra de pai e filho, Leopold e Rudolf Blaschka. Leopold Blaschka (1822-95) foi um imigrante tcheco em Dresden, hoje Alemanha. Em uma viagem aos Estados Unidos, em 1853, seu navio ficou parado em uma calmaria e ele se encantou por uma exibição espetacular de bioluminescência de um tipo de água-viva chamado sifonóforos. Decidiu estudar o animal mais de perto e criar outros semelhantes em vidro.
David Brown e eu viemos para o Havaí com o objetivo de fazer vídeos de tantos cefalópodes parecidos com os de Blaschka quanto pudermos encontrar.
Os oceanos estão mudando rapidamente, com um aumento de 30% em acidez nos últimos 200 anos, um aquecimento letal em muitos mares tropicais, significativa poluição costeira e excesso de pesca em praticamente todo lugar. Se houve um tempo para comparar o passado de abundância com um oceano ameaçado, esse tempo é hoje.
As probabilidades de encontrar cefalópodes são muito maiores à noite. Por isso fizemos uma série de mergulhos noturnos em recifes, seguidos por um mergulho em água profunda a cinco quilômetros da costa de Kona.
Ele nos levou a 300 metros de profundidade, com a possibilidade de encontrar tubarões-tigres e grandes tubarões-brancos. O capitão desligou as luzes, para ver melhor a "magia negra" bioluminescente.
Prendemo-nos a nossas linhas de segurança e deslizamos para a escuridão pontilhada por manchas bioluminescentes. Tivemos de chegar perto para identificar se esses brilhos eram de águas-vivas, ctenóforos, salpídeos ou lulas. Os clarões de luminescência se transformaram em uma corrente de plâncton minúsculo.
O que eu realmente esperava ver eram os sifonóforos, as criaturas que tanto inspiraram Leopold Blaschka em 1853.
O modelo de vidro da Apolemia uvaria tem a forma básica de um sifonóforo que eu vi à minha frente -a grande campânula natatória, sua usina de força para mover-se rapidamente, e os longos tentáculos pendurados, cada um com seu arpão cheio de neurotoxina, que são armadilhas mortais para todo tipo de camarões e peixes pequenos.
Os sifonóforos deram um show para nós, embora fossem extremamente difíceis de filmar.
Quando eles se encontram em perigo, seu sistema nervoso dispara um sinal para os músculos, que encolhem os tentáculos e acionam a campânula natatória em alta velocidade. Uma série de tentáculos venenosos com um metro de comprimento se contraem em um instante para oito centímetros.
A próxima etapa em nossa busca é o Mediterrâneo. Irei para a Estação Marítima de Nápoles, na Itália, que forneceu aos vidreiros muitos de seus animais vivos.
Talvez encontremos exemplares idênticos a invertebrados espetaculares como o polvo de tentáculos enrolados (Eledone moschata) e o sifonóforo gigante Apolemia uvaria, que com seis metros de comprimento pode dominar uma rede alimentar mediterrânea.
De todo modo, esperamos descobrir se eles sobrevivem no mar de forma tão magnífica quanto no vidro.