quinta-feira, 15 de abril de 2010

Extinção entre o mar e o rio


Estudo inédito revela que um em cada seis manguezais do mundo está ameaçado
Sinal de alerta para um dos ecossistemas mais peculiares do planeta. Originados a partir do encontro das águas doce e salgada, os manguezais têm uma entre seis espécies ameaçadas de extinção.
É o que revela o primeiro estudo global sobre o seu estado de conservação.
Contra eles, diz o trabalho publicado na revista "PLoS One", pesam inimigos nada naturais, como o desenvolvimento urbano descontrolado nessas regiões costeiras. Manguezais são fundamentais para o desenvolvimento de diversas espécies, além de absorverem CO2 da atmosfera, filtrarem as águas e fornecerem nutrientes para outros habitats marinhos.

Segundo o estudo, conduzido pela Conservação Internacional (CI) e pela União Internacional para a Conservação da Natureza (IUCN), onze das 70 espécies analisadas por um grupo formado pelos maiores especialistas em manguezais do mundo estão incluídas na Lista Vermelha de Espécies Ameaçadas da IUCN.

- Os manguezais estão onde nós estamos, ou seja, na interface entre a terra e o mar, onde vive boa parte da população da Terra, em torno de um bilhão de pessoas - diz o biólogo marinho Rodrigo Moura, da Conservação Internacional.

- Trata-se de um ambiente constantemente pressionado.

No mundo todo, as costas Atlântica e Pacífica da América Central são as regiões mais afetadas por fatores que incluem também o desmatamento e as mudanças climáticas.
O sudeste da Ásia, onde foram perdidos 80% dos manguezais nas últimas seis décadas, também é uma área severamente afetada.

- A perda potencial dessas espécies é um reflexo da exploração generalizada das florestas de mangue - afirma uma das autoras do estudo, Beth Polidoro, da Old Dominion University, nos EUA .

- Os manguezais são um dos mais importantes ecossistemas tropicais. Eles mantêm diversas espécies e suas perdas podem ter um impacto muito grande na biodiversidade marinha e terrestre.

Criação de camarão causa impacto

O estudo aponta como seriamente ameaçadas de extinção alguns tipos de plantas, como a Bruguiera hainesii, que cresce apenas em parte da Indonésia, Malásia, Singapura e Papua Nova Guiné.

- O status dessas espécies simboliza as agressões a um ambiente que é fundamental para a vida nos oceanos e também para o cotidiano das comunidades costeiras - conta Greg Stone, vice-presidente do Programa Marinho da CI.

O estudo não aponta espécies ameaçadas no Brasil. Isso, no entanto, não significa que os manguezais do país estejam livres de perigos, como alerta Rodrigo Moura.

- O Brasil tem alguns dos maiores manguezais do mundo, embora não os mais ricos em espécies. E eles mostram bem como se dá a relação entre ocupação e devastação.

Os manguezais da região norte estão em bom estado de conservação, bem diferente daqueles do sudeste e do nordeste. Isso se dá porque no norte a ocupação urbana é bem menos intensa do que no sudeste e no nordeste. Na Baía de Guanabara, por exemplo, o manguezal sofre demais com o impacto dos afluentes domésticos e industriais.
Segundo o especialista, um outro fator tem causado forte impacto nesse ambiente, embora não seja tão divulgado.

- É a conversão do manguezal em área de criação de camarões, a carcinicultura. Esse é um vetor de destruição em todo o mundo e no Brasil não é diferente, especialmente no nordeste.

Se por um lado essa conversão produz alimentos, a perda que ela traz é muito maior se formos analisar os inúmeros serviços ambientais prestados pelos manguezais.

Um desses serviços, diz Moura, é a sua atuação como uma espécie de berçário da vida marinha.

- Muitas espécies de peixes comercialmente importantes dependem dos manguezais nas etapas iniciais do seu ciclo de vida. É o caso do vermelho, que é muito popular no nordeste. Além dele, há espécies de crustáceos que também precisam desse refúgio para se desenvolver. O importante é olharmos para esse estudo como um sinal de alerta global.

O Brasil não tem espécies ameaçadas, sem dúvida, mas o ecossistema como um todo está em risco.

JC e-mail 3989, de 14 de Abril de 2010.